Uma ampla análise do DNA de africanos proveu um quadro detalhado da rica diversidade genética daquele continente, além de fornecer pistas sobre a história da evolução e das migrações de vários grupos. Esse trabalho poderá ajudar os cientistas a focalizar as populações com maior diversidade para estudo posterior e aumentar as possibilidades da identificação das variações genéticas associadas a doenças.
A pesquisa, realizada por uma equipe internacional de cientistas durante quase uma década, sugere que os africanos de hoje tiveram sua origem em 14 grupos populacionais do passado, que, ao se misturarem livremente, deram origem às distintas populações que existem hoje. A equipe de pesquisadores descobriu, também, que os afro-americanos descendem principalmente de populações da região ocidental da África, como seria de se esperar, tendo em conta a história de comércio de escravos.
Os cientistas basearam sua análise em amostras de DNA de cerca de cem afro-americanos e mais de 2.400 africanos de todo o continente. "O escopo dos dados é realmente extraordinário", afirmou Molly Przeworski, geneticista especializada em estudos populacionais, da Universidade de Chicago, em Illinois, que não participou do estudo. "Nós simplesmente não sabíamos tanto quanto deveríamos sobre a genética das populações africanas, e esse é um passo importante nessa direção."
Genes e idiomas
Os seres humanos de hoje tiveram sua origem primeiro no continente africano, há cerca de 200 mil anos, antes de migrarem para outras partes do mundo. Atualmente, a África possui mais de 2 mil grupos de diferentes etnias e idiomas. No entanto, os estudos genéticos dos africanos têm se limitado a um pequeno número de populações, ou não têm coberto grandes partes do genoma. Embora os geneticistas soubessem que os africanos apresentam maior diversidade genética do que os não africanos, os detalhes da ampla variação do genoma em muitas populações é algo que permanecia obscuro.
Uma equipe liderada pela geneticista Sarah Tishkoff, da Universidade da Pensilvânia, na Filadélfia, acaba de publicar uma pesquisa realizada com amostras de DNA de 2.432 africanos, de 113 populações, incluindo grupos da Nigéria, República de Camarões, Tanzânia, Quênia e Sudão, além de amostras de não africanos do Iêmen. Eles procuraram por diferenças em 1.327 trechos do genoma e compararam os resultados com dados existentes de 8 grupos africanos e 59 grupos de não africanos. A equipe, a seguir, organizou análises estatísticas para agrupar os indivíduos de acordo com sua semelhança genética e para determinar sua descendência.
Os resultados confirmaram que a variabilidade genética da África é enorme, maior que no resto do mundo, e sugerem que os africanos surgiram de 14 grupos ancestrais. A maioria das populações africanas parece apresentar traços genéticos de múltiplos grupos ancestrais, corroborando as evidências linguísticas e arqueológicas anteriores de migrações que teriam levado a essas misturas.
A análise sugere, também, que caçadores coletores de diferentes regiões e culturas, incluindo os pigmeus da África Central e grupos do sul da África que falam idiomas que apresentam cliques consonantais [como é o caso do idioma Khoisan]*, podem ser descendentes de uma população ancestral. Os grupos genéticos geralmente se associavam em etnia e idioma, embora a equipe de pesquisadores tenha encontrado exceções, em casos em que os grupos haviam perdido ou talvez substituído seu idioma. Esse trabalho foi publicado no periódico científico norte-americano Science.
Mapa da diversidade
Embora os resultados gerais não sejam surpreendentes, esse estudo fornece uma visão detalhada da variação genética em um grande número de populações africanas, afirmou Noah Rosemberg, geneticista da Universidade de Michigan, em Ann Arbor, que planeja colaborar com Tishkoff. "Esses resultados mostram quanta diversidade existe realmente na África", disse ele.
Os pesquisadores também analisaram o DNA de quatro populações afro-americanas e encontraram uma média de 69% a 74% de descendência de uma grande família de língua africana basicamente ocidental, chamada Níger-Cordofão. A análise sugere que a maioria dos indivíduos tem, provavelmente, descendência mista de vários grupos do oeste africano. Como as diferenças entre esses grupos são sutis, a equipe de pesquisadores afirmou que, sem dados genéticos extras, pode ser difícil para os afro-americanos identificarem suas tribos de origem.
David Reich, geneticista da Harvard Medical School, em Boston, Massachusetts, diz que a pesquisa poderá ajudar os cientistas a determinar quais grupos, capazes de representar a profunda diversidade do continente africano, deveriam ser estudados em seguida. "Esse estudo fornecerá um guia", diz Reich, que colaborou com Tishkoff. Ao focalizar os grupos africanos com maior diversidade, completa Reich, os cientistas poderão encontrar mais variações genéticas associadas a doenças.
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